Anarquismo nos Bálcãs

Texto: Absorto

Os Bálcãs despertaram meu interesse logo cedo. Talvez tenha sido a primeira guerra da qual tive notícia. Na metade dos anos 90, na época em que a guerra se desenrolou, eu tinha idade o suficiente para captar as mensagens que estampavam as capas dos jornais e busquei fazer algum sentido de todos aqueles corpos estirados. Lembro de minha mãe se esforçando para tentar me explicar o que eram os estupros em massa e como soldados eram capazes de tal barbárie. Estávamos de férias na praia, eu devia ter uns 8 anos e tudo isso teve um grande impacto em mim.

Anos mais tarde, conheci na internet duas pessoas que moravam na Sérvia e começamos a nos corresponder. Nossa amizade, ainda que virtual, foi forte o suficiente para que eu fizesse planos de viajar até lá, passando por outros países da região. A minha viagem para lá nunca vingou, e com o tempo perdemos contato, mas esses planos todos me deixaram familiarizados com a região.

Anarquismo nos Bálcãs

Recentemente tive a chance de participar de um debate com um anarquista vindo da Eslovênia que estava passando pelo Bra$il. Ele estava por aqui para o 3º Fórum Geral Anarquista, que rolou em Campinas em Junho e veio representando a Federação pelo Anarquismo Organizado da Eslovênia e Croácia. Depois do Fórum ele acabou viajando até Belo Horizonte para propor um debate sobre o anarquismo na região.

           A Eslovênia é um pequeno país na península Balcânica com apenas 2 milhões de habitantes. Como outros países dos Bálcãs, tem vivido uma onda crescente de movimentações anarquistas nos últimos quinze anos, impulsionada pelos movimentos antiglobalização e, mais recentemente, pelos impactos da crise e da austeridade.

Até então, não existia uma forte presença anarquista na região, com exceção da Grécia e Bulgária. Na Eslovênia, por exemplo, apenas se tem notícia de expressões anarquistas na Segunda Guerra Mundial. Nessa época anarquistas se juntaram axs Partisans – de tendência Marxista-Leninista – na luta contra a ocupação nazista. Após o fim da guerra, esses indivíduos foram duramente perseguidos com a consolidação da República Socialista da Iugoslávia, e o anarquismo só viria a ter um respiro novamente como parte da contracultura punk nos anos 80¹.

No início dos anos 90, durante a Guerra Civil da Iugoslávia, anarquistas tornaram a se organizar para combater o nacionalismo, em protesto contra a guerra e para trabalhar no auxílio das pessoas atingidas pela guerra.

Anarquistas no novo milênio

As grandes mobilizações contra a globalização econômica fizeram com que anarquistas voltassem às ruas nos anos 2000. Desde então, têm tido um papel crucial nas lutas sociais e grande influência na contracultura da região. Em 2011, assim como acontecia em muitas outras cidades ao redor do mundo, uma ocupação na praça em frente a Bolsa de Valores de Liubliana protestou contra o capitalismo internacional e o sistema financeiro. A ocupação durou seis meses e serviu para expôr as entranhas do capitalismo e suas inerentes desigualdades à todas as pessoas dispostas a escutar.

No final de 2012 uma revolta contra a instalação massiva de radares de velocidade em Maribor, segunda maior cidade da Eslovênia, tomou grandes proporções e foi reprimida brutalmente pela polícia. Em solidariedade, manifestações radicais tomaram o país e reivindicaram a queda de todos os governantes. Esse levante teve forte presença de anarquistas de outros países dos Bálcãs assim como da própria Eslovênia.²

Dois anos mais tarde, um levante como esse também chegou à Bôsnia, levando milhares de pessoas às ruas e culminando com uma gigantesca fogueira de papéis expropriados dos prédios administrativos do governo. Diferentes etnias se uniram contra todo e qualquer governo. De um lado do rio a sede do partido cristão, do outro a sede do partido muçulmano, ambas incendiadas numa demonstração de que os conflitos étnicos e religiosos agora dão um lugar à uma revolta generalizada contra todo o poder.

Enquanto isso, em Liubliana, duas gigantescas ocupações fazem notar a presença libertária bem no coração da cidade. A ocupação conhecida como Metelkova, com mais de 20 anos de existência, é um enorme complexo de prédios que serviam de alojamento para o exército nacional da Iugoslávia antes de ficarem desocupados. No início, ativistas tentaram negociar com a prefeitura um projeto de ocupação cultural do espaço, mas não foram ouvidxs. Pouco depois a cidade iniciou um processo de demolição do local e como resposta o complexo foi ocupado. Hoje em dia a cidade tenta legalizar o local, se utiliza da burocracia para tentar amortecer a influência radical da ocupação já que reconhece que não é possível desalojá-la por meio da força.

Desde o inicio, a ocupação do espaço é muito heterogênea. Com espaço para a contracultura punk, techno e artística, ginásios para treinos de artes marciais, cooperativas e salas ocupadas por diversos coletivos anarquistas, incluindo a Federação pelo Anarquismo Organizado da Eslovênia;

A Fábrica Autônoma ROG é a outra ocupação que divide o centro com a Metelkova. Ocupada em 2006, costumava ser uma fábrica das bicicletas ROG antes de ficar abandonada. Hoje hospeda várias iniciativas como bares, galerias de arte, ateliês, um centro social para migrantes e refugiadxs, espaços para shows, oficina de bicicletas e duas pistas de skate, sendo uma delas a maior pista de skate coberta da península balcânica. Em 2016 a cidade tentou desalojar a ocupação, mas enfrentaram uma rápida mobilização que expulsou a polícia, e os operários e suas máquinas que estavam prontas para derrubar os prédios. Na correria, algumas máquinas ficaram para trás e viraram decoração do pátio depois de pintadas de pink.

Aprender e Criar

A forte presença anarquista na região me surpreendeu muito e fiquei com a sensação que muitos dos desafios e aprendizados do movimento de lá podem servir de inspiração para o que fazemos por aqui. As manifestações de julho de 2013 aqui no Bra$il, por exemplo, sofreram de falhas muito similares aos problemas que anarquistas da Eslovênia e Sérvia enfrentaram nos seus levantes de 2012 e 2014. A longa experiência de luta contra o nacionalismo nos Bálcãs, pode nos render alguma reflexão quanto às táticas que iremos usar para frear a ascensão da direita brasileira. E também a importância de construirmos espaços duradouros e heterogêneos de contracultura, que sirvam como afirmação e prática radical de nossos sonhos.


Notas:
¹ É senso comum na Eslovênia que o movimento punk foi um dos principais motores da derrubada do governo socialista de lá.
² Os levantes levaram à queda do prefeito de Maribor e do presidente da Eslovênia, mas também à cooptação das assembleias de democracia direta, que passaram a ser organizadas por ONGs a serviço do governo.
³ Relato e análise sobre as assembleias e o levante na Eslovênia, parte da série de Crítica Anarquista à Democracia ainda sem versão em português → https://crimethinc.com/2016/05/11/feature-gotovo-je-reflections-on-direct-democracy-in-slovenia
Ótimo texto sobre os levantes na Bôsnia, também parte da série de Crítica Anarquista à Democracia

 

Nativas Feministas Comem Tofu

Coisa Preta disponibiliza aqui este texto de Margaret Robinson que traz uma releitura ecofeminista e póscolonial das lendas Mi’kmaq como base para um veganismo indígena. Confira o texto abaixo ou baixe a versão em PDF.

Nativas Feministas Comem Tofu

Margaret Robinson

Nativas Feministas Comem Tofu
Margaret Robinson

Este texto propõe uma leitura ecofeminista pós-colonial das lendas Mi’kmaq como base para uma dieta vegana enraizada na cultura indígena¹. Tal projeto se depara com duas barreiras significativas. A primeira é a associação entre veganismo e branquitude.

Drew Hayden Taylor descreveu se abster de carne como uma prática de pessoas brancas (Taylor 2000a, 2000b). Em uma piada no começo de seu documentário, Redskins, Tricksters and Puppy Stew, ele faz a pergunta: “Como você chama um Nativo vegetariano? Um caçador muito ruim.” O ecologista Robert Hunter (1999) descreve as pessoas veganas como “eco-jesuítas” e “fundamentalistas vegetarianas”, que “forçam indígenas a fazer coisas do modo do homem branco” (p. 100-113). Ao projetar o imperialismo branco nas pessoas veganas Hunter legitima as onívoras brancas a se conectarem com as Nativas através do hábito de comer carne. Em Stuff White People Like, o autor satírico Christian Lander (2008) retrata o veganismo como uma tática para manter a supremacia branca. Ele escreve: “Como com muitas atividades das pessoas brancas, ser vegana/vegetariana permite com que elas sintam como se estivessem ajudando o meio ambiente e lhes dá uma forma meiga de sentirem superiores às outras” (p. 38).

Quando o veganismo é construído como uma coisa das pessoas brancas, aquelas pessoas das Primeiras Nações que escolhem uma dieta sem carne são retratadas como se estivessem sacrificando sua autenticidade cultural. Isso apresenta um desafio para aquelas de nós que vêem nossas dietas veganas como compatíveis cultural, espiritual e eticamente com nossas tradições indígenas.

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Retomada Mbyá-Guarani – Relato da Reunião de Apoiadores

Depois de três dias e noites reunindo-se e conversando entre si, os Mbyá-Guarani de Maquiné chamaram para uma reunião as pessoas e organizações que apoiam a Retomada Guarani. Essa reunião aconteceu no domingo, 02 de abril, na nova aldeia Mbyá-Guarani de Maquiné (ainda sem nome), na área que antes era usada pela FEPAGRO – Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária, extinta pelas políticas de austeridade do governador José Ivo Sartori.

“Ninguém é sem ninguém.” – Cacique André dos Mbyá-Guarani de Maquiné.

Os caciques André, de Maquiné, e Cirilo, da Lomba do Pinheiro e representante dos Guarani de todo Rio Grande do Sul, demonstraram imensa alegria e esperança pela construção dessa nova aldeia em uma terra tão rica e fértil. Ao contrário das terras geralmente demarcadas pelo Estado – improdutivas, tomadas por monoculturas de soja e eucalipto, inadequadas para o modo de vida tradicional dos Guarani – a terra retomada para a construção da nova aldeia é coberta de mata nativa, árvores frutíferas e nascentes de água potável cristalina. Eles deixaram clara a intenção de resistir e lutar pela terra, indiferente do que o homem-branco e suas instituições decidirem.

Depois de breves falas dos dois caciques, abriu-se um espaço para que as apoiadoras e apoiadores se apresentassem. Apresentaram-se representantes e integrantes da Ação Nascente Maquiné (ANAMA), Associação de Estudos e Projetos com Povos Indígenas e Minoritários (AEPIM), Amigos da Terra Brasil, Jornal Já, diversos professores e estudantes dos cursos de antropologia e geografia da UFRGS, partidários do Movimento Raiz, fiéis de uma igreja (não identificada), além de várias anarquistas e moradoras de Maquiné que apóiam a retomada Guarani.

 “Não precisamos subir degraus pra ter poder, pra falar. Na nossa cultura qualquer criança pequena tem esse poder.” – Cacique Cirilo

Houveram algumas intervenções que informaram o andamento dos processos jurídicos. Sobre a liminar que pede a “reintegração de posse”, que retiraria a terra dos indígenas e as recolocaria nas mãos do Estado: um juiz de 2ª instância deveria se manifestar na terça-feira, 04 de abril. Mesmo no caso de o juiz ordenar a reintegração de posse, ela não deverá ser imediata, pois a Brigada Militar não pode interferir com os povos indígenas sem a presença da FUNAI e da Polícia Federal. Os apoiadores dos mbyá-guarani que estão acompanhando a questão legal apresentaram um certo otimismo.

Outra informação relevante é que um antropólogo da FUNAI iria comparecer a aldeia na segunda-feira, 03 de abril, para começar a levantar dados sobre a retomada.

“Por quê não nos dão uma terra boa para criar galinha, pra plantar batata-doce, pra não dependermos do Estado? É uma forma que o Estado cria pra nos dominar.” – Cacique Cirilo

Depois das conversas no turno da manhã, foi servido um almoço. À tarde os caciques retomaram a conversa, pedindo para os militantes do Movimento Raiz explicarem o que é esse movimento. Seguiu-se então um mini-comício do partido por cerca de 20 minutos, explicando os seus conceitos e suas aspirações. O discurso foi tão sedutor que o próprio Cacique Cirilo, ao fim, falou que já que os guarani estão recebendo apoio do Raiz ele não via por quê eles também não poderiam apoiar o movimento. Não ficou claro se o Cacique compreendeu que está lidando com um partido político, que está em processo de coleta de assinaturas para sua regularização para assim concorrer a cargos no governo.

Em seguida falou-se do levantamento de verbas para realizar dois encontros do povo guarani que eles consideram muito importantes para fortalecer a retomada. Aparentemente, o Raiz tinha ficado responsável por esta campanha, divulgando contas bancárias para que apoiadores fizessem essas doações. Parece que não chegaram nem perto do valor necessário – entretanto não se mencionaram valores, nem o quanto é necessário, nem o quanto foi arrecadado. Militantes do partido falaram então em realizar um projeto para conseguir verba através da Igreja Luterana. Nesse momento o Cacique André demonstrou sua frustração, explicando que não entende por que o branco faz tanto projeto e projeto e nunca faz as coisas de fato.

“As burocracias existem pra que a gente não consiga fazer nada.” – Cacique Cirilo

Aparentemente, o que os guarani precisam para realizar os encontros são muitas taquaras para construir o telhado de 20 casas, transporte para essas taquaras e para os guarani de outras aldeias possam ir ao encontro e alimentação para o encontro.

“O juruá (homem-branco) adora fazer reunião. É reunião o tempo todo. Eu não agüento mais reunião. Daqui a pouco vou ficar branco de tanta reunião.” – Cacique Cirilo

Conclusões

Os mbyá-guarani demonstram ter uma visão autonomista, compatível com os valores anarquistas (como dá pra perceber pela citações dos caciques ao longo deste texto). Eles estão recebendo bastante apoio na área jurídica e inclusive com doações de alimentos. Entretanto parece que em alguns aspectos o apoio à retomada encontra-se preso nas burocracias das instituições que os apóiam.

Embora anarquistas e outros apoiadores autônomos tenham tido um papel importante na solidariedade com a Retomada Guarani, com produção audiovisual, transporte, organização de campanhas independentes de arrecadação de doações, ficamos com a impressão que eles são meio que deixado de lado pelas instituições, das quais não percebemos nenhum esforço com o compartilhamento de informações e criação de uma ampla rede de comunicação e articulação para os apoiadores da Retomada. Por exemplo, falou-se de em caso de “reintegração de posse” pelo Estado, que todos fossem à aldeia prestar sua solidariedade com os guarani, mas não se falou de como se fará a comunicação para a difusão dessas informações para que um número significativo de apoiadores consiga comparecer de fato à aldeia. Quando perguntamos sobre a existência de algum canal de comunicação entre os apoiadores, as instituições foram reticentes e evasivas.
Também tememos que com a presença de partidos políticos, os mbyá-guarani possam ser usados e influenciados a apoiarem essas causas, que lhes são vendidas com as mais doces palavras.

Por essas duas razões – a falta de uma rede autônoma de apoio e solidariedade à Retomada Guarani, que faz com que muitos apoiadores não saibam como ajudar e se somar, e a presença de partidos políticos – achamos importante uma participação anarquista mais articulada e organizada.Sentimos que uma rede verdadeiramente autônoma é capaz de difundir as necessidades da Aldeia e engajar mais pessoas a se somar em solidariedade e defesa à essa retomada. Deixamos o convite para que entre em contato pelo nosso e-mail para construir essa articulação.

“Ninguém manda no Guarani. Ele que sabe como viver e onde viver. Somos livres pra ir onde quisermos. Os brancos não entendem isso.” – Cacique André


ATUALIZAÇÃO: o governo do RS pediu a suspensão da reintegração de posse por 30 dias para tentar negociar com os Guarani. Mais informações aqui.


Flores do Mal

Um relato sobre a Biblioteca Kaos, a família Chaves Barcellos Wallig e a gentrificação de Porto Alegre.

Recentemente, a Biblioteca Anárquica Kaos ocupou uma casa abandonada há décadas no Centro Histórico de Porto Alegre. O imóvel, assim como um conjunto de imóveis que o cercam, pertence a uma das famílias mais ricas e tradicionais da capital os Chaves Barcellos / Wallig¹. Embora as construções sejam tombadas, seus proprietários planejam demolí-la para ali fazerem novos empreendimentos. Isso explica o abandono dos imóveis, pois como é proibido demolí-los, seus donos simplesmente os abandonam até que caiam pela ação do tempo.

O pai, João Wallig Filho, pretende construir ali um edifício garagem, enquanto seu filho, o arquiteto João Felipe Chaves Barcelos Wallig quer fazer um complexo de contâineres, com restaurantes vegetarianos, feira orgânica e outras coisas destinadas ao público jovem. Nenhum dos projetos pretende preservar as construções históricas.

Motores da Gentrificação

Os Chaves Barcellos Wallig possuem um papel ativo na gentrificação em Porto Alegre: são os responsáveis pelo Vila Flores, projeto que transformou um conjunto arquitetônico no bairro Floresta, largado pelos seus proprietários à décadas, em um pólo da assim chamada “economia criativa”. Em um texto de sua própria autoria no site Arq.Futuro, João Felipe fala sobre como “os moradores decidiram sair voluntariamente”. A história não foi bem assim segundo seu próprio pai, João Wallig.

Vila Flores: pólo de gentrificação no bairro Floresta.

Quando coletivo Cidade da Bicicleta perdeu seu espaço no Menino Deus e João ofereceu para ele um espaço no Vila Flores, ele lhes disse que sim, alguns moradores saíram voluntariamente, mas também relatou que no final teve que conseguir uma interdição do prédio, para forçar a saída de pessoas que se recusavam a abandonar o local onde viviam. Remover os moradores originais de um prédio, para substituí-los por jovens artistas, ateliers e outros profissionais “criativos” com o intuito de “revitalizar” uma região é claramente um processo de gentrificação, por mais que os Wallig já tenham um discurso pronto para se defender destas acusações.

Um dos próximos alvo deles são essas construções no Centro Histórico.

A Biblioteca Kaos

Cartaz de divulgação da inauguração do novo espaço da Biblioteca Kaos.

A Biblioteca Kaos é uma biblioteca anarquista que antes ocupava uma casa na Rua Alberto Torres, no bairro Cidade Baixa, mas que foi desalojada em 2016. Ela possui um catálogo de publicações para consulta e empréstimo, mas também edita suas próprias publicações, organiza e promove eventos, como debates, e inclusive foi sede para a 6ª Feira do Livro Anarquista de Porto Alegre.

Em seu site foi publicada uma nota sobre a nova sede e os confrontos com os Chaves Barcellos Wallig:

O domingo 12 de março entramos na casa da Rua Coronel João Manoel 641, antes o morro da formiga. Casa que estava abandonada faz três anos, no meio do centro histórico de Porto Alegre, e que é parte das heranças de duas das famílias mais burguesas, donos da cidade faz séculos: Chaves Barcellos e Wallig.

Temos a absoluta certeza de que estamos incomodando os poderosos que já apareceram para nos ameaçar e muito risivelmente para nos convidar a ser parte dos seus projetos de capitalismo alternativo. Nossa resposta é uma só: somos ocupas, anarquistas, e com a burguesia não temos conversa nenhuma.

Para nossa surpresa e alegria, a vizinhança apoia totalmente a ocupação porque vieram que poucas pessoas arrumaram um espaço que faz anos estava sem uso. A interação com eles foi uma clara atitude de solidariedade e iniciativa não só nas palavras mas sobretudo na ação, participando pouco a pouco da limpeza do lugar e apoiando com sua presença em algumas das visitas dos donos.

Depois das ameaças dos Burgueses de nos jogar pra fora com seus capangas e pitbulls, as galera das outras okupas da cidade chegaram para nos fazer sentir sua solidariedade e ajuda.

Neste momento ainda estamos na briga pelo espaço mas nossa decisão desde o início é permanecer sem negociação, nem jurídica nem verbal com os proprietários. A ocupação é uma pratica subversiva que não pode ser engolida pelas normas de propriedade imobiliária, é a resposta efetivas à acumulação absurda da terra em mão de uns poucos privilegiados. Nossa determinação diante disto é clara: casa abandonada, casa ocupada.

Desde um novo espaço, aqui seguimos onde sempre estivemos: na procura da liberdade e contra toda autoridade!

Biblioteca Anárquica Kaos.

Daqui pra frente

Como a própria nota da Kaos relatou, uma das primeiras tentativas de “negociação” dos Wallig foi tentar cooptar a biblioteca, prometendo-lhe um espaço dentro de seu futuro empreendimento. Quando sua proposta não foi aceita, partiram para ameaças, que foram desde voltar lá com cães bravos para arrancá-los à força ou conseguir uma condenação da estrutura do prédio junto à Defesa Civil para uma desocupação forçada. É a mesma estratégia de gentrificação já usada no complexo Vila Flores. Se puderem convidar pessoas jovens e descoladas para ocuparem inicialmente o novo empreendimento, garantindo-lhe uma imagem de espaço diverso e plural para atrair o público jovem e assim “revitalizar” o espaço, ou seja, aumentar o valor de seu empreendimento, ótimo, senão eles farão com que as pessoas sejam removidas de lá à força.

Aparentemente, os Wallig ainda não deram entrada num processo judicial de reintegração de posse. Talvez não o tenham feito por receio de que, com isso, venham à tona seus planos ilegais de demolir prédios históricos para criação de novos empreendimentos.

Se a ideia fosse mesmo “revitalizar” a região, ou “dar um presente” à cidade, por quê estão deixando os prédios desocupados, caindo, há tanto tempo? Por que não, por exemplo, transformá-los em moradias populares? Ou doá-los à cidade para a criação de albergues para a população de rua? Com certeza os Chaves Barcellos Wallig não deixariam de ser ricos com isso.

Eles querem usar nossos sonhos para encher ainda mais os seus bolsos, já abarrotados. Não deixaremos!

Toda solidariedade à Biblioteca Anárquica Kaos! Abaixo a gentrificação!


  1. Seu antepassado, João Wallig, foi um dos fundadores da Taurus, maior fábrica de armas do Brasil. Do outro lado da família estão os Chaves Barcellos já eram capitalistas pelos menos desde o início do século 20 – já foram proprietários de lanifícios, moinhos, hotéis e fazendas em Guaíba, Alegrete e Uruguaiana.
  2. arqfuturo.com.br/frontend/home/post/1231

 

Tire quem você ama do Facebook.

Escrevi isso para meus amigos e familiares, para explicar por que a última política de privacidade do Facebook é muito perigosa. Talvez isso ajude também. Referências externas – e passos para sair corretamente – estão na parte inferior.

“Ah sim, eu estava querendo perguntar por que você está saindo do Facebook”, é a pergunta que estou ouvindo muito nestes dias. Como se soubéssemos que o Facebook é ruim, mas não gostaríamos realmente de saber.

Eu fui um grande adepto do Facebook – um dos primeiros usuários no meu grupo social que o defendeu como uma ótima maneira de ficar em contato, isso lá em 2006. Eu tenho a minha mãe e irmãos nele, e cerca de 20 outras pessoas. Eu mesmo ensinei marketing no Facebook em um dos maiores projetos de educação em tecnologia do Reino Unido, a Digital Business Academy. Eu curto tecnologias e trabalho com marketing – então posso perceber as implicações – e até agora, elas não tinham me preocupado. Não dei muita bola para as pessoas que hesitam em se preocupar com sua privacidade.

Apenas checando…

Durante as festas de fim de ano de 2014/15, eu pensei que eu tiraria alguns minutos para checar as novas mudanças na política de privacidade. Com a nossa informação financeira e de localização, além de tudo o resto, havia algumas possibilidades preocupantes. E na verdade o que eu suspeitava já havia acontecido há 2 anos, começou em 2011! Poucos minutos se transformaram em alguns dias de leitura. Eu descartei um monte de alegações que podem ser explicadas como tecnicamente plausíveis (ou tecnicamente preguiçosas), com base em um pouco de investigação, como as excessivas permissões de aplicativos do Android. Mas ainda faltava muita coisa, e eu comparei esses fatos com técnicas que eu conheço como prática padrão no marketing orientado por dados.

Com esta mudança de privacidade mais recente em 30 de janeiro de 2015, estou com medo.

O Facebook sempre foi ligeiramente pior do que todas as outras empresas de tecnologia com registros de privacidade desonestos, mas agora, está em uma categoria à parte. Sair do Facebook não é apenas necessário para proteger a si mesmo, é necessário para proteger seus amigos e familiares também. Este poderia ser um ponto de onde não é mais possível voltar atrás – mas não é tarde demais para retomar o controle.

Uma pequena lista de algumas práticas do Facebook

Não é só o que o Facebook diz que vai tirar de você e fazer com suas informações, é tudo o que não diz, e faz de qualquer maneira por causa das brechas que criam para si em seus Termos de Serviço e como eles voltam atrás no que disseram. Nem precisamos mais clicar em “Concordo”. Eles apenas mudam a política de privacidade e ficando no Facebook, você já está concordando. Oops!

O Facebook não mantém nenhum dos seus dados seguro ou anônimo, não importa o quanto você tente controlar nas suas configurações de privacidade. Essas configurações são uma mera distração. Há violações de privacidade muito sérias, como vender o seu apoio a um produto para anunciantes e políticos, rastrear tudo o que você lê na internet ou usar dados de seus amigos para aprender coisas privadas sobre você – e não há como desativar isso.

O Facebook dá os seus dados para “terceiros” através do seu uso de aplicativos e, em seguida, dizer que é você que está fazendo isso, não eles. Toda vez que você usa um aplicativo, você está permitindo que o Facebook escape de sua própria política de privacidade em relação a você e seus amigos. É como quando meu irmão costumava me forçar a dar socos em mim mesmo e depois perguntar, “por que você está socando a si mesmo?” Então ele dizia a minha mãe que não era culpa dele.

À medida que eu investigava, eu descobri toda a espionagem que o Facebook faz – que eu chequei com artigos de fontes de notícias de boa reputação e estudos acadêmicos que foram fortemente escrutinados.

Parece louco quando você coloca tudo junto!

“Eu não tenho nada a esconder”

Muitas pessoas não estão preocupadas com isso, sentem que não têm nada a esconder. Por que eles se preocupariam com uma pessoa tão comum como eu? Por que eu deveria me preocupar com isso quando eu não estou fazendo nada de errado?

A história que ficou famosa da adolescente grávida sendo exposta pela loja Target, depois de ter escrutinado seus dados de compra – bolsas maiores, comprimidos de dor de cabeça, lenços – e enviou-lhe uma mensagem de “parabéns” como marketing, que seu pai que não estava ciente, leu por engano. Ops!

A mesma coisa é feita com você e revelado a qualquer empresa sem o seu controle. E isso extrapola para diferentes formas nas quais os seus dados podem revelar coisas sobre você para pessoas que você não gostaria que soubessem.

Um dos problemas mais óbvios aqui é com as companhias de seguros. Os dados que eles têm sobre você são coletados para prever seu futuro. Você gostaria que lhe fosse negado o direito de ter seguro saúde porque um algoritmo falsamente previu que você começou a ver um cardiologista?

E o que acha de um empregador ou possível empregador saber que você pode estar grávida?

Você gostaria que seu chefe soubesse quando você não está realmente em casa doente, ou quando você começa a procurar por outro emprego?

Você gostaria que todo mundo soubesse que você está tendo problemas para pagar o financiamento da sua casa? Se você está tentando vendê-la, os compradores teriam uma vantagem.

Não confunda privacidade com confidencialidade. Eu sei o que você faz no banheiro, mas mesmo assim você fecha a porta. Isso é porque você quer privacidade, não confidencialidade. (Extraído de I have nothing to hide. Why should I care about my privacy?)

Enquanto muitas de nós sentem que não têm nada a esconder, todas nóś passamos por situações onde precisamos que certas coisas fiquem em segredo, pelo menos por um determinado tempo. Mas estamos abrindo mão disso – e pra que?

Extraído dos Termos de Serviço (não da Política de Privacidade – tá vendo o jogo deles?):

Você nos dá permissão para usar seu nome, imagem do perfil, conteúdo e informação relacionando-os com conteúdo comercial, patrocinado ou relacionado (como uma marca que você gosta), hospedado ou melhorado por nós.

E mais além:

Por “informações” entendemos fatos e outras informações sobre você, incluindo ações tomadas por usuários e não-usuários que interagem com o Facebook.

Ou seja, isso inclui tudo o que eles estão coletando sobre você, mas não lhe contam. Tudo que você lê on-line, tudo que alguém publica sobre você, todas as suas transações financeiras privadas.

E, seus dados começam a ser combinados com os dados de seus amigos para tornar esses modelos mais precisos. Não é apenas sobre você e seus dados, mas o que é feito com tudo isso junto.

A questão aqui não é o que temos que esconder, é manter um importante direito à nossa liberdade – que é o direito à privacidade, e o direito de poder opinar em como a informação sobre nós é usada. Nós estamos desistindo desses direitos para sempre usando o Facebook.

Se você já admitiu algo ilegal em uma mensagem privada do Facebook, ou até mesmo mencionou seu apoio a uma causa política, isso pode ser usado contra você no futuro, especialmente pelo governo de outro país. Você pode acabar preso por estar no lugar errado na hora errada, ou apenas puxado de lado no aeroporto um dia, e passar algum tempo de prisão por ter revelado que você fez algo que o governo considera ilegal há 5 anos. Um comediante de Nova York teve sua casa invadida por uma equipe da SWAT com base em uma piada que postou. As autoridades muitas vezes agem equivocadamente, e você está lhes dando mais poder e mais chance de erro. Você está carregando a arma, apontando-a para sua cabeça, e entregando-a a todos aqueles que estejam dispostos a comprar seus dados.

Não há necessidade de falar hipoteticamente sobre a vigilância do governo. Um dos primeiros investidores do Facebook chamado Greylock tem conexões com a direção de uma empresa de investimentos da CIA chamada In-Q-Tel. De acordo com seu site, ela “identifica tecnologias de ponta para ajudar a Agência Central de Inteligência e a Comunidade de Inteligência mais ampla dos EUA para promover suas missões”. E se você ainda não ouviu – foi revelado que os dados do Facebook são entregues diretamente para o mega programa de vigilância PRISM.

Corretores de dados comerciais

E, como vou explicar mais tarde, a maioria dessas informações chega a público de qualquer maneira. Não há necessidade de programas da NSA pois existem empresas de marketing de dados que desanonimizam todos os seus dados para vendê-los de novo e de novo. Isso é feito sistematicamente e automaticamente. Há uma indústria em torno disso. Existem mercados para comprar e vender dados do consumidor, que originalmente começou em torno de agências de crédito e empresas de mala direta, em seguida, crescendo com a indústria de barra de ferramentas para navegador quando o Internet Explorer era grande – agora eles estão cheios de mais informações do que nunca. Um exemplo recente é o RapLeaf que coletou e divulgou informações pessoalmente identificáveis, incluindo identidades de Facebook e do MySpace. Eles pararam depois de uma séria controvérsia, mas não só o dano foi feito, como houve outras empresas que escaparam ilesas e mantiveram a mesma prática. Não se trata de como os anunciantes dirigem os anúncios para você, é que seus dados são comprados e vendidos para quem quiser tentar.

Onde você poderia viajar no futuro? Você confia na polícia com toda esta informação sobre você? Porque elas estão comprando.

Interceptando sua comunicação

O negócio é que você não precisa de uma teoria da conspiração para se preocupar. O próprio Mark Zuckerburg tem sido aberto e consistente quando fala com seus investidores sobre suas intenções:

  1. Ser o intermediário em toda a comunicação pessoal — É por isso que eles fizeram o Messenger e compraram o WhatsApp, mas não esqueçam que eles tentaram coisas piores. Quando fizeram o e-mail do Facebook, eles aproveitaram os usuários que estavam sincronizando seus contatos do Facebook. Eles fizeram isso para que o endereço do facebook.com de todo mundo fosse o padrão. Por quê? Para que seus amigos enviem e-mails para o seu endereço @ facebook.com e não para o endereço de sua preferência, e assim eles também seriam capazes de ler seus emails.
  2. Para ao longo do tempo tornar pública toda a comunicação pessoal — É por isso que eles lentamente mudaram o padrão das configurações de privacidade para público, tornaram as configurações de privacidade mais difíceis de usar e agora estão fingindo que seu assistente de privacidade vai mudar isso.

Na realidade, há um monte de violações de privacidade que você não pode desligar, como permitir que os anunciantes usem seu endosso para anunciar para seus amigos, desligar o modo como o Facebook acompanha o que você lê na internet ou impedir o Facebook de coletar outras informações sobre você. Você não pode desligar isso!

O Facebook não deixa você compartilhar o que você quer

Mesmo se você não tem nada a esconder, você tem que se preocupar com o oposto, o que o Facebook escolhe esconder mas que você quer que seja compartilhado. Eles filtram você.

A frase “Eu estava querendo perguntar por que você está saindo” geralmente vem depois de algo como, “você não viu meu post na semana passada?”

Se você já teve essa conversa, você notou que há uma grande desconexão entre suas expectativas quando você se comunica no Facebook e o que realmente acontece. Basicamente, o Facebook filtra as suas postagens baseadas na consideração de se as pessoas vão usá-lo mais ou menos se não as virem.

Parece que o Facebook é a única maneira de permanecer em contato. Através de fotos e comentários. Parece que todo mundo está lá e você está recebendo um bom fluxo de notícias sobres as suas vidas.

Na realidade, muitos dos seus posts nunca são vistos por ninguém! E você também não recebe coisas dos seus contatos. Mesmo que as coisas de seus amigos cheguem direitinho pra você, isso não significa que as suas coisas chegam a elas.

Mensagens privadas são ruins também. Quantas mensagens do Facebook você envia que ficam sem resposta? Quantas mensagens do Facebook você acha que se esqueceu de responder, ou perdeu completamente? É assim que você quer tratar seus amigos?

O Facebook é uma forma realmente não confiável para ficar em contato.

No último mês, eu simplesmente parei de usar o Facebook. Algo surpreendente aconteceu. As pessoas telefonaram para mim, e nós realmente pusemos a conversa em dia. Minha família estava mais em contato. Meu irmão me enviava e-mails com atualizações. Amigos apareceram na minha casa para dizer olá.

Foi algo, tipo, social.

Censura política

O Facebook bloqueia postagens com base em conteúdo político de que não gosta. Eles bloquearam posts sobre Ferguson e outros protestos políticos. Quando Zuckerberg supostamente ficou um pouco louco e proibiu a palavra “privacidade” nas reuniões no Facebook, ela também foi bloqueada de qualquer post no Facebook. Você recebia uma mensagem de erro sobre “conteúdo impróprio”. Sim, uh huh. Inadequado para quem?

Não devemos nos surpreender. Facebook não é uma plataforma neutra – precisamos estar cientes dos planos das pessoas por trás disso. Zuckerberg tem sido aberto sobre suas intenções. Bem como o primeiro membro da diretoria do Facebook – o politicamente conservador Peter Thiel. Na sua juventude, ele escreveu um livro desafiando o multiculturalismo em Stanford, e agora promove uma teoria chamada Desejo Memético que, entre outras coisas positivas, também pode usar os grupos sociais das pessoas para manipular seus desejos e intenções. (Eu sou um fã de Thiel quando se trata de startups – mas muitas vezes esquecemos que todo mundo lá fora não sabe essas coisas.)

O Facebook vai tão longe quanto deixar que organizações políticas bloqueiem a comunicação do usuário. Só é preciso que algumas pessoas marquem a mesma publicação como ofensiva, e ela some da linha do tempo de todos. Isso é muitas vezes abusado. Eu posso bloquear qualquer artigo do Facebook, obtendo alguns amigos para marcá-lo como ofensivo. Censura barata e fácil.

Nós vimos como isso afetou as eleições norte-americanas em 2017. A linha do tempo das pessoas tinha as opiniões políticas contrárias filtradas, mas as notícias falsas se espalhavam facilmente pois essas manchetes falsas reforçam as nossas crenças e ficamos felizes em compartilhá-las.

Tudo isso aponta para o fato de que é ruim contar com o Facebook para se comunicar com pessoas que são importantes para você. Seu hábito de usar o Facebook significa que outras pessoas têm de confiar no Facebook para se comunicar com você.

É um ciclo vicioso.

Isso realmente prejudica seus relacionamentos com muitas pessoas porque você acha que está em contato com elas, mas não está. Na melhor das hipóteses, você está em contato com uma versão filtrada dos seus amigos. Esses relacionamentos se esvanecem, enquanto seus relacionamentos com pessoas que fazem posts “amigáveis ao Facebook” tomam seu lugar.

Não só o Facebook quer ler toda a sua comunicação, mas também quer controlá-la.

Dedurando os seus amigos

Mesmo se você estiver meio que bem com isso para você, ao usar o Facebook, você está forçando seus amigos e família a aceitar o mesmo. Mesmo aqueles que não estão no Facebook ou vão tão longe quanto usar nomes falsos para tentar proteger sua privacidade.

Se você já usou a sincronização de contatos do Facebook ou usou o Facebook em seu telefone celular, o Facebook capturou sua lista de contatos completa. Nomes reais, números de telefone, endereços, e-mails, tudo. Eles usam isso para criar “perfis sombra” das pessoas que você conhece que não estão no Facebook. Não-usuários do Facebook muitas vezes vêem isso em ação, na forma de e-mails que recebem do Facebook, contendo suas informações pessoais. Os usuários do Facebook podem ver isso quando carregam uma foto de um não-usuário do Facebook e eles são automaticamente marcados. Meu amigo não está no Facebook, mas como eu e alguns amigos usamos o Facebook em nossos telefones, o Facebook tem seu nome e informações de contato, além de saber quem são seus amigos porque o vê em seu catálogo de endereços e registros de chamada. Basta subir um par de imagens com o seu rosto, e pronto – eles podem identificá-lo em imagens – adicionando os dados de localização das imagens para o seu perfil sombra. Muitas das outras técnicas do Facebook funcionam também em perfis sombra. Além de tudo isso, eles podem deduzir muito precisamente muita coisa sobre ele baseadas em similaridades estatísticas em relação aos seus amigos.

Então, basicamente, todos nós estamos inadvertidamente espionando nossos amigos que queriam proteger sua privacidade. O Facebook nos enganou.

Mas os truques do Facebook vão mais longe.

“Privacidade” não se aplica ao que o Facebook descobre

Como os perfis sombra de pessoas, o Facebook pode “deduzir um like” com base em outras informações que tem sobre você, como o que você leu na Internet ou o que você faz em apps nos quais você faz login através do Facebook. Chame isso de “like sombra”. Isso permite que o Facebook venda suas informações para mais anunciantes.

Já está bem documentado que o Facebook coleta essas informações. A técnica do “like sombra” é simplesmente o uso padrão de técnicas estatísticas no marketing de dados. Se você lê muito sobre um assunto, você provavelmente gosta dele. Esse tipo de coisas. Estas técnicas têm sido usadas no marketing desde os anos 80, e você pode contratar estudantes universitários de estatística para realizá-las, embora, claro, o Facebook contrate os melhores do ramo e procurem sempre o último grito da tecnologia de inteligência artificial para isso. Na Europa, o Facebook é legalmente obrigado a compartilhar exatamente quais informações ele tem sobre você – mas eles se recusam. Portanto, há ainda outra ação coletiva contra eles.

Permissão

Através do seu labirinto de redefinições de palavras como “informações”, “conteúdo” e “dados”, você está permitindo que o Facebook colete todos os tipos de informações sobre você e exponha isso aos anunciantes. Somente com a sua permissão eles dizem, mas a definição de “permissão” inclui o uso de aplicativos e quem sabe o que mais.

E você achava que aquelas solicitações do Farmville eram irritantes. Toda vez que você viu uma, aquele amigo estava revelando suas informações para “terceiros”.

Assim, efetivamente, tudo o que você marcou como “somente amigos” não importa tanto. Estando no Facebook, há muito mais informações sobre você que são coletadas, combinadas, compartilhadas e usadas.

Eles dizem que “anonimizam” isso, mas na realidade, é muito simples desanonimizá-lo. Um monte dos dados anônimos, como o que e quando você postou, imagens de você, a sua localização em um determinado momento, é o que basta para que um grande número de empresas consiga vincular esses dados anônimos de volta a você – e passá-los adiante.

Além disso, eles permitem que todos os aplicativos do Facebook tenham total acesso às suas informações – com o seu nome e tudo. E mesmo que você nunca use qualquer aplicativo no Facebook, seus amigos permitem. Quando eles usam esses aplicativos, seus amigos compartilham todas as suas informações também. Há toda uma indústria por trás disso.

Algumas coisas têm botões para desligar, mas tenha em mente que eles são temporários, e como o Facebook tem feito no passado, ele irá trocá-los de volta sem avisá-lo. Quando o Facebook começou (e provavelmente quando você se registrou), era claramente um lugar seguro para compartilhar apenas com seus amigos. Essa foi a grande promessa deles. Com o tempo, eles mudaram a configuração de privacidade padrão para público, para que, se você ainda quisesse manter o Facebook apenas para amigos, teria que encontrar manualmente mais de 100 configurações em várias páginas de configurações ocultas. Então, eles começaram a abandonar essas configurações e forçaram a que as informações fossem públicas de qualquer maneira.

Por que você ainda está socando a si mesmo? 🙂

Vendendo seu endosso sem seu consentimento

Você pode ter observado anúncios de Facebook com endosso dos seus amigos embaixo deles. Basicamente, o Facebook dá aos anunciantes o direito de usar você como apoiador, mas você não tem controle sobre isso. Não está limitado a quando você clicou em um botão de like. Houve casos conhecidos de vegetarianos endossando o McDonalds, uma mulher feliz e casada há muitos anos endossando sites de namoro e até mesmo um garoto endossando um clube de sexo para sua própria mãe!

Esses casos foram tão embaraçosos que as pessoas descobriram. As pessoas os expuseram. Mas na maioria dos casos, estes são endossos que não são descobertos – as pessoas assumem que eles sejam verdadeiros. Isso é ainda mais assustador porque o Facebook é usado pesadamente para publicidade política e endossos de produtos. As pessoas sabem que eu levantei dinheiro para crianças com câncer antes, então elas podem não ficar surpresas se virem um anúncio onde eu estou apoiando um programa da Igreja para crianças pobres na África. Mas eu categoricamente só apoio programas que não são associados a religiões, uma vez que se sabe que só apoiam as pessoas que se convertem. Pior ainda, muitas pessoas podem presumir coisas sobre minhas crenças religiosas com base nesses endossos falsos.

Abusando da confiança dos seus amigos em você

Não temos como saber se o nosso endosso tem sido usado para vender porcarias em nosso nome. Eu não quero pensar sobre minha mãe desperdiçando seu dinheiro em algo que ela pensava que eu estava endossando, ou meus clientes que fundam startups vendo anúncios de produtos inúteis com o meu rosto neles.

Usar o Facebook significa que isso acontece o tempo todo. Os anunciantes podem comprar seu endosso no Facebook e suas informações de corretores de dados de terceiros. Você nunca saberá disso, e você não pode desligá-lo.

A última mudança de privacidade

Finalmente, eu quero explicar como esta última mudança de privacidade torna as coisas piores e muito mais fora de seu controle se você ficar no Facebook. O Facebook está exigindo rastrear o que você compra, e suas informações financeiras, como conta bancária e números de cartão de crédito. Você já aceitou isso com os nos novos Termos de Serviço. Ele já começou a compartilhar dados com o Mastercard. Eles vão usar o fato de que você ficou no Facebook como “permissão” para fazer acordos com todos os tipos de bancos e instituições financeiras para obter os seus dados deles. Eles vão dizer que é anônimo, mas como eles enganam seus amigos para revelar seus dados para terceiros com aplicativos, eles vão criar brechas aqui também.

O Facebook também está insistindo para rastrear sua localização através do GPS do seu telefone, em todos os lugares e todo o tempo. Ele vai saber exatamente com quem você passa seu tempo. Eles vão saber seus hábitos, eles sabem quando você alega doença para não comparecer ao trabalho, mas na verdade está jogando boliche. “O Zé gosta de jogar boliche às 14h no Bolão do Júlio.” Eles vão saber se você se juntar a um grupo de narcóticos anônimos, ou for a um psiquiatra, a um psíquico, ou encontrar uma amante. Eles saberão quantas vezes você foi ao médico ou hospital, e serão capazes de compartilhar isso com possíveis seguradoras ou empregadores. Eles saberão quando você está secretamente buscando um novo emprego e venderão o seu endosso a sites de emprego para seus amigos e colegas – você será exposto.

Eles saberão tudo o que possa ser revelado pela sua localização e usarão da forma que for para fazer uns trocados.

E – será tudo feito retroativamente. Se você ficar no Facebook depois de 30 de janeiro, não há nada que impeça toda as suas localizações passadas e dados financeiros de serem usados. Eles obterão seus dados de localização anteriores quando seus amigos fizerem check-in com você e os dados de GPS armazenados em fotos que você aparece. Eles vão puxar seus registros financeiros antigos – aquele remédio constrangedor que você comprou com seu cartão de crédito há 5 anos será adicionado ao seu perfil para ser usado como o Facebook quiser. Será vendido repetidas vezes, e provavelmente usado contra você. Ele será compartilhado com os governos e estará livremente disponível através de diversas companhias de “terceiros” empresas que não fazem nada, além de vender dados pessoais, e irreversivelmente eliminar a sua privacidade.

Agora isto é irreversível.

Dados financeiros e de localização não são apenas realmente sensíveis, eles permitem que “terceiros” desanonimizem informações sobre você. Isso capacita massivamente esses terceiros para coletar todas as informações disponíveis sobre você, incluindo informações calculadas que você nunca revelou. Esta é uma situação onde mesmo o próprio Facebook terá problemas para manter a privacidade de seus dados – não que eles se importem.

Isso é sem precedentes, e assim como você nunca teria imaginado que o Facebook iria vender seus endossos quando você se inscreveu em 2009, é muito difícil prever o que o Facebook e os vendedores de dados de terceiros farão com este novo poder.

Isso é simplesmente uma conseqüência de seu modelo de negócios. O Facebook vende você, porque é exatamente assim que eles ganham dinheiro. E eles estão sob forte pressão de seus investidores para ganhar mais.

O que você pode fazer sobre isso? O Facebook lhe dá duas opções: aceitar tudo isso, ou saltar fora do ônibus do Facebook.

Para ser honesto, este ônibus está ficando barulhento, irritante e um pouco fedorento, não é? E a tarifa é muito cara em primeiro lugar. Sabe, eu nem tenho certeza se está indo na direção certa…

Como sair dessa bagunça

De acordo com o acordo da FTC (Comissão Federal de Comércio dos EUA) de alguns anos atrás, depois que o Facebook foi processado pelo governo dos EUA por suas práticas de privacidade, o Facebook é “obrigado a impedir qualquer pessoa de ter acesso ao material de um usuário mais de 30 dias após o usuário ter excluído sua conta;”

Existem diferentes interpretações para isto. Alguns dizem que você precisa excluir cada post separadamente, outros dizem excluir sua conta, e alguns dizem que eles ainda vão manter seus dados de qualquer maneira – que tudo que você pode fazer é parar de lhes dar mais dados.

Então apagar a sua conta do Facebook (não desativá-la) é necessário para parar isso, e então há algumas outras etapas para tentar desfazer o dano:

Preparação (Opcional)

  1. Use a ferramenta do Facebook para baixar os seus arquivos
  2. Pegue as suas fotos. Eu usei este aplicativo de Android uma vez que o Facebook não te dá todas as suas fotos, nem em resolução máxima. (Eu também baixei a página com a lista dos meus contatos – simplesmente rolando para o fundo para carregar todos, e clicando em Arquivo -> Salvar (honestamente, até agora eu não precisei do arquivo ainda).
  3. Se você quer ser extremamente cuidadoso apague as suas postagens do Facebook individualmente com este script. Isso é necessário de acordo com algumas interpretações do que o Facebook pode guardar.
    E então tem os apps que você usou. Esta é uma das maiores brechas do Facebook pois eles dizem que não podem controlar o que os aplicativos fazem com os seus dados depois que você lhes deu acesso. Então, eu salvei no meu disco rígido a página de configurações que mostra os aplicativos que usei, e removi o acesso de cada um deles manualmente. Cada um destes apps tem sua própria política de privacidade – a maioria delas são causa perdida, alegando poderes ilimitados aos meus dados, então estou apenas desativando-os e seguindo em frente.

Apagando a sua conta

  1. Apague a sua conta do Facebook. Não deixe o Facebook enganar você para “desativá-la”.

Outras precauções

Para parar o Facebook (e outros) de rastrear o que eu leio na web, eu uso o Firefox com a proteção de rastreamento ativada. (Eis como. (eles fazem isso mesmo se você não tem uma conta no Facebook).

Se você não estiver usando o Firefox, a EFF tem um plugin para navegadores chamado Privacy Badger. (Aproveitando, o EFF fez este ótimo plugin que escolhe automaticamente a conexão web mais segura, tornando mais difícil para os governos e provedores de acesso à internet bisbilhotarem sua atividade na web).

E tem os dados que foram vazados para os corretores de dados. Você pode requisitar que eles os apaguem.

O que subsitui o Facebook?

No começo, eu pensei em usar alternativas ao Facebook. Eu sentia uma necessidade de substituir o Facebook por algo similar como Diaspora*, mas na verdade e-mail e telefone têm sido muito melhor! Depois de um mês fora Facebook, eu não sinto a necessidade de uma substituição direta. O telefone – afinal – todo mundo já tem um, e esquecemos como eles são super fáceis e convenientes de usar. Mais recentemente, todos nós entramos em uma grande sala de bate-papo. Eu atualmente recomendo o Signal para isso. Você pode fazer ligações, chats e compartilhar imagens, tudo de forma criptografada, e muita pouca coisa é armazenada nos seus servidores. É na verdade melhor que o Facebook uma vez que é mais imediato e pessoal.

Se você tiver outras idéias ou conselhos, entre em contato. Isto é o que eu vejo como um passo responsável para impedir que eu, minha família e meus amigos sejamos privados de nossa liberdade.

Lembre-se, isso não é apenas sobre as coisas técnicas. Ao ficar no Facebook, você está concedendo-lhes permissão para coletar e usar informações sobre você, independentemente de você mesmo usar a Internet. E, ao continuar nele, os dados que coletam sobre você são usados para criar modelos de seus amigos e familiares mais próximos, mesmo que eles tenham escolhido sair.

Internet é livre e aberta, mas isso não significa que devemos aceitar sermos espionados.

Ultimamente, o mundo está cheio de pessoas que dizem “isso nunca vai acontecer”, e quando isso acontece, eles mudam para “não há nada que possamos fazer”. Há sim. A Internet foi descentralizada durante 50 anos, e está cheia de opções, por design, que nos permitem manter a privacidade. Nós podemos opinar sobre o mundo em que queremos viver – se agirmos. Além disso, podemos ajudar todos a compreenderem, e ajudá-los a fazer suas próprias escolhas mais informados.

Essa postagem foi lida por 1.000.000 de pessoas agora. É um sinal positivo que podemos informar e educar a nós mesmos!

Por favor, compartilhe isso com pessoas que são importantes para você. Mas para ser honesto, mesmo que este post seja realmente popular, é claro que muitas pessoas estão presumindo o que está nele sem lê-lo. Compartilhar um link não é tão bom como falar com alguém.

Se você chegou tão longe e quer compartilhar com alguém próximo, eu sugiro que você faça o que eu fiz – pegue o telefone.

 

Artigo de Salim Virani, traduzido pelo coletivo Coisa Preta.